sábado, 7 de novembro de 2009

Minha minissaia

Esse é um blog de Criminologia, que trata não só das críticas relações entre os implicados no sistema de controle penal, mas também de toda a sorte de discursos punitivos, que se refiram ao castigo, banimento, segregação, extermínio e outros que pretendem imputar culpa.

A história da criminologia começou com a caça às bruxas. O poder punitivo é oriundo da necessidade da Igreja de reprimir interpretações diversas ao texto sagrado. Inicia-se, por volta do séc. XII o extermínio dos ditos movimentos heréticos, e as principais criminosas da época foram as mulheres que ousaram louvar/agradecer/celebrar outras formas de misticismo que não o monoteísta-cristão.

Um manual de identificação das feiticeiras fora publicado no séc. XV, o Malleus Maleficarum ou Martelo das Bruxas, cuja característica principal é a misoginia. De acordo com seus autores
"Toda bruxaria vem de luxúria carnal, que na mulher é insaciável". (Baigent e Leigh, 2001:128).

"Para Baigent e Leigh (2001), a igreja sempre fora mais que um pouco inclinada à misoginia. A caça às bruxas forneceu-lhe um mandado para uma cruzada em larga escala contra as mulheres, contra tudo o que era feminino, impondo um controle autoritário sobre as mulheres que as tornou subordinadas, mantendo-as no lugar que se julgava apropriado."(citação retirada desse artigo sobre Sexualidade e Bruxaria).


O pecado era (era?) um mal a ser combatido.


Costumamos nos horrorizar com o passado, provavelmente porque mal assimilado. E assim, a questão retorna, se atualiza, mas ainda é a velha neurose social com a liberdade e a sexualidade feminina.

Faço essa introdução para apresentar um poema de Eve Ensler, que nos remete ao famigerado caso Uniban. Geisy Arruda foi banida por uma turba de colegas, e agora expulsa daquela universidade por usar um vestido rosa-choque que perturbou a paz institucional (sobre o desconcerto causado pelo corpo feminino nas instituições vejam o texto de Raphael Neves
aqui).

(Referência: ANITUA, Gabriel Ignacio. Histórias dos Pensamentos Criminológicos. Rio de Janeiro: Revan, 2008.)

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Minha Minissaia

(Eve Ensler - Tradução livre de Raphael Neves)


Minha minissaia não é um convite
uma provocação
uma indicação
do que eu quero
ou dou
ou que eu flerto.

Minha minissaia
não está implorando por isso
não está querendo que você
a arranque de mim
ou a abaixe até o chão.

Minha minissaia
não é um argumento jurídico
para você me violentar
ainda que já tenha sido
e não vai servir de prova
em nenhum tribunal.

Minha minissaia, acredite ou não
não tem nada a ver com você

Minha minissaia
tem a ver com a descoberta
do poder das minhas pernas
e do ar frio do outono passeando
pelo interior das minhas coxas
tem a ver com tudo o que eu vejo
ou passo ou sinto viver dentro de mim.

Minha minissaia não é prova
de que eu seja estúpida
ou indecisa
ou uma menininha maleável.

Minha minissaia é meu desafio
e você não vai me amedrontar
Minha minissaia não está se exibindo
é esta que eu sou
antes que você me faça cobri-la
ou disfarçá-la.
Acostume-se.

Minha minissaia é felicidade
Eu posso me sentir no chão.
Sou eu aqui. E eu sou gostosa.

Minha minissaia é liberação
bandeira no exército das mulheres
Eu declaro estas ruas, quaisquer ruas
o país da minha vagina.

Minha minissaia
é água azul turquesa
onde nadam peixes coloridos
um festival de verão
na escuridão estrelada
um pássaro cantando
um trem chegando em uma cidade estrangeira
minha minissaia é um rodopio
um suspiro profundo
um passo de tango
minha minissaia é
iniciação
apreciação
excitação.

Mas acima de tudo minha minissaia
e tudo que ela cobre
é Meu.
Meu.
Meu.


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